POR: Irene
de Barros Pereira
A
bengala branca é sem dúvida um dos principais meios de acessibilidade e o mais
importante recurso de mobilidade para o deficiente visual, tornando-o
independente e trazendo a segurança necessária no seu dia a dia.
Em
muitos casos o uso da bengala é o resultado de um processo de reabilitação ou
habilitação em instituições especializadas no assunto. Após este processo a
bengala fará parte do deficiente visual como se fosse um membro ou algo parecido.
Com
tanta importância na vida do deficiente visual me pergunto e não é de hoje,
quem inventou a bengala branca? Perguntei aqui e ali e ninguém soube me
responder. O meu consolo? Não ser a única ignorante no assunto. Mas a
curiosidade continuou: quem inventou a bengala? Quem teve a brilhante ideia de
usá-la pela primeira vez? QUEM?
·
A
surpresa da descoberta:
Descobri
o óbvio, desde sempre, desde os tempos bíblicos a humanidade já usava um
bastão, vara, cajado... Essas palavras lhe são familiares? É claro que são. Quem
nunca ouviu falar do cajado de Moisés abrindo o mar para que os judeus
escapassem dos egípcios?
A
gente só se dá conta de que era uma bengala quando pensa no assunto, pois ele o
usava em suas andanças pelo deserto, inclusive para pastorear as ovelhas assim
como tantos outros que desvendavam os mistérios de terrenos bem acidentados
como os do deserto com o auxílio de um cajado.
Se
pensarmos um pouco mais, nos daremos conta de que reis, papas e imperadores
também usavam e usam um cajado, vara, bengala ou cetro, que fica mais
bonitinho, além de lhes conferir realeza e dignidade, aliás, podemos pensar
nisso com mais cuidado, afinal a realeza é para poucos, mas a dignidade é
direito de todos.
Se
olharmos historicamente para a humanidade, veremos que em muitos momentos as
pessoas usavam bastões ou varas como um prolongamento do braço para desse modo
desvendar os obstáculos do espaço à sua frente.
Então,
voltando à literatura histórica e bíblica há mais de uma passagem onde se fala
do cajado e ela sempre estava nas mãos de homens mais velhos, logo, homens com
alguma dificuldade visual ou física por conta da idade. Em outros registros em
gravuras, nota-se o uso de bastões ou cajados por pessoas cegas.
Há
registros dando conta de que pessoas cegas também se utilizavam da companhia de
cães, claro que tudo era feito na base da intuição ou improvisação. Fica claro
então, que terrenos inapropriados impunham aos cegos a companhia de guias
videntes ou a reclusão no ambiente do lar quando não, em depósitos de gente
estranha e diferente.
É
bom lembrar que esse estigma nos acompanhou até bem pouco tempo, embora ainda
nos dias de hoje não seja incomum encontrar alguém que tenha ouvido uma dessas
frases: "o que esse cego está fazendo na rua?", ou "devia ficar
em casa!". Aposto que alguém conhece alguém que já ouviu algo semelhante.
·
Avançando
no tempo
Os
tempos mudaram as mentalidades também e graças a isso, escolas para cegos foram
abertas e a criação do sistema braille possibilitou a proximidade dos cegos com
as letras, a aritmética ou matemática, a história e todas as ciências, ou seja,
os cegos tinham para onde ir e onde se instruir, o que lhes faltava era um meio
bom e seguro para fazer essa locomoção.
Na
primeira metade do século XX, a volta para casa de soldados cegos, europeus e
norte-americanos, depois da primeira e segunda grande guerra, provocou o desejo
de se fazer algo para a inserção desses soldados na sociedade, logo perceberam
que a locomoção segura e independente seria o primeiro passo nessa direção e a
partir dos avanços das tecnologias e das iniciativas da época, a história
individual e social da vida dos deficientes visuais mudou radicalmente.
·
Avanços
que mudaram a história dos deficientes visuais até aquele momento:
- 1784
– a criação de escola para cegos, iniciada por Valentin Haüy;
- 1825
– invenção do Sistema Braille por Louis Braille;
- 1930
– primeira providência no sentido de serem usadas bengalas brancas com
extremidade inferior vermelha, para identificar seu portador, suscitar
eventuais ajudas pelos pedestres videntes e alertar os condutores de veículos,
foi de George Benham, presidente do Lion's Club do estado de Illinois, Estados
Unidos;
- 1930
– o Lions Club Peoria Illinois (EUA), apresentou uma proposta de lei que após
ser aprovada foi chamada Lei da Bengala Branca. Dava prioridade no trânsito ao
deficiente visual que portasse uma bengala branca;
- 1940
– o norte-americano, Dr. Richard Hoover (1915-1986), professor especializado no
ensino de cegos, engajado na reabilitação de militares deficientes, desenvolveu
técnicas específicas de locomoção e criou um modelo padronizado de bengala
longa, hoje universalmente adotados;
- 1970
– foi instituído o dia Internacional da Bengala Branca de Segurança
("International White Cane Safety Day"), sob iniciativa da Federação
Internacional dos Cegos ("International Federation of the Blind"), em
Paris. Muitos países comemoram esta data como meio de divulgar as conquistas
das pessoas cegas no exercício de seu direito de locomoção em espaços sejam eles
públicos ou privados;
- 1964
– a Federação Nacional dos Cegos dos Estados Unidos ("National Federation
of the Blind" -- NFB), sob a liderança de seu presidente, Dr. Jacobus
tenBroek (1911-1968), em campanha nacional, obteve do Congresso
norte-americano, a Resolução HR 753, que autoriza o Presidente dos Estados
Unidos a proclamar anualmente o dia 15 de outubro como o "Dia da Bengala
Branca de Segurança", cujo primeiro ato foi assinado em outubro daquele
ano pelo presidente Lyndon Johnson.
O
Dr. tenBroek, cego desde tenra idade, brilhante professor universitário,
elaborou um modelo de lei sobre a Bengala Branca, que em seu primeiro artigo
estabelece:
"É
política deste Estado estimular e capacitar os cegos, os deficientes da visão e
os deficientes físicos a participar plenamente da vida social e econômica do
Estado e serem aproveitados em atividades remuneradas".
Essa
é a realidade dos norte-americanos, pelo menos em tese, não conhecemos a
realidade deles de fato, mas sabemos que no Brasil, com exceção dos que ainda
têm vergonha, a vergonha faz parte do processo de muitos assim como outros
motivos, veja o que a Marly Solanowski nos conta em seu depoimento que é bem
interessante, a bengala é amplamente usada pelos deficientes visuais.
·
Conclusão:
Como
podemos perceber com esses dados históricos, a bengala branca, assim como
muitas outras coisas, não foi criada por uma só pessoa. Foi um processo de
evolução de ideias de acordo com a necessidade de cada período histórico citado
acima, ou seja, no final das contas quem inventou a bengala de fato foi a
necessidade.
Embora
a grande maioria use a bengala branca, ou longa, vemos em todos os lugares, uma
diversidade de cores e de materiais. Claro que essa diversidade vem acompanhada
de custos igualmente diversos, dando a cada um a possibilidade de escolher o
que mais agrada ou cabe em seu bolso.
Ao
nos recusarmos em fazer uso da bengala, seria bom lembrarmos dela em seu
contexto histórico, pois assim caminha a humanidade, com altos e baixos ou
seja, realeza, dignidade, vergonha e preconceito fazem parte de sua
mentalidade, a pergunta é: onde eu me encaixo, qual minha visão sobre esse tema
e mais, qual a visão que tenho de mim, porque no final das contas é essa visão
que importa, inclusive para os outros.
Fonte: http://www.movimentolivre.org/
* O TEXTO ENCONTRA-SE EM SEU FORMATO ORIGINAL. ERROS GRAMATICAIS E DISTORÇÕES SÃO DE RESPONSABILIDADE DO AUTOR.
essa foi uma contribuição da amiga e colega de trabalho Izabeli Matos. bjs, querida!!!
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