1. CONCEITO
As ototoxicoses são afeções iatrogênicas provocadas por drogas medicamentosas que alteram o ouvido interno (labirinto). Essas drogas podem afetar o sistema coclear ou o sistema vestibular ou ambos, alterando duas funções importantes do organismo: a audição e o equilíbrio.
2. FISIOPATOLOGIA :
Dos grupos de drogas ototóxicas, os antibióticos aminoglicosídeos são talvez os mais importantes, sem dúvida os mais estudados. Alguns autores concluíram que estes antibióticos combinam com receptores das membranas das células ciliadas do órgão de Corti, da mácula sacular e da utricular e das cristas do sistema vestibular. Esses receptores são os polifosfoinosítideos, são Iípides componentes da membrana celular com papel importante nos eventos bioelétricos e na permeabilidade da membrana por interação com íon cálcio. A formação de complexos entre os antibióticos aminoglicosídeos e os polifosfoinosítideos produz modificações na fisiologia da membrana e na sua permeabilidade, acabando por afetar a estrutura e função dos cílios, em primeiro lugar, e depois da própria membrana e, finalmente, por causar destruição das células receptoras (Schacht, 1977).
3. AGENTES ETIOLÓGICOS - MEDICAMENTOS OTOTÓXlCOS
É importante conhecer os diferentes tipos de drogas que podem provocar ototoxicidade, para sua prevenção. Nos primeiros tratamentos de Sífilis com mercúrio já se podia ser detectado lesões ototóxicas. Há descrições de casos com desenvolvimento de surdez, tremores e "loucura", sugerindo tanto oto como neurotoxidade. Entre elas está o grupo dos antibióticos aminoglicosídeos, como a estreptomicina, a diidroestreptomicina, a neomicina, a canamicina A e B, a paramomicina, a aminosidina, a gentamicina, a amicacina, a tobramicina, a netilmicina. Desse grupo, estreptomicina, tobramicina, gentamicina são mais vestibulotóxicos que cocleotóxicos; os outros são mais cocleotóxicos. Alguns antibióticos não aminoglicosídeos têm sido citados na literatura como ototóxicos. São eles: a eritromicina, com efeitos reversíveis; o cloranfenicol, principalmente por ação tópica; a ampicilina; a minocilina, derivado da tetraciclina com ação vestibulotóxica; a cefalosporina, com poucas referências; a viomicina; a capreomicina, com maior toxicidade vestibular; a polimixina B e E; a colistina. Existem alguns grupos de drogas ototóxicas que não são antibióticos; é o caso de desinfetantes, como clorexidlne, benzetônio, benzalcônio, iodo, iodine, iodoforo e álcoois, como etanol e propilenoglicol. Essas drogas são usadas as vezes como desinfetantes em cirurgias do ouvido médio para assepsia e podem provocar ototoxicidade por ação local. Existe o grupo dos b-bloqueadores, como practolol e propanolol, com referências de alterações cocleares com perda auditiva. Diuréticos, como o ácido etacrínico, a furosemida, a bumetanida, a piretamida e a indapamida, são cocleotóxicos mas as alterações auditivas são reversíveis. Essas drogas não são vestibulotóxicas; entretanto potenciar a ação dos aminoglicosídeos. Drogas antiinflamatórios, como salicilatos, aspirina, quinino, podem provocar alterações auditivas, a cocleotoxicidade dos salicilatos e da aspirina reversível. Antineoplásicos podem ser ototóxicos, como é o caso da cisplatina, da mostarda nitrogenada e da vincristina. Essa cocleotoxicidade pode ser reversível ou irreversível. Os contraceptivos orais podem provocar em alguns casos perdas auditivas uni ou bilaterais progressivas e irreversíveis (Oliveira,1989).
4. QUADRO CLÍNICO
4.1- DIAGNÓSTICO:
Devemos ressaltar que é de suma importância a história médica do paciente. Na anamnese, quando há antecedentes de tratamento com essas drogas, o diagnóstico torna-se muito fácil. As vezes, a utilização da droga pode ser suspeitada de modo indireto, quando o paciente ou os familiares informam que após infecção séria houve tratamento com antibiótico, cujo nome não sabem referir, e que após esse tratamento ocorreram perda auditiva, vertigens e desequilíbrio. O aparecimento da perda auditiva pode ser rápido ou insidioso, podendo ocorrer durante a exposição a um agente ototóxico ou meses depois da mesma ter sido interrompida. A perda pode ser precedida ou acompanhada por um tinitus agudo. Se o sistema vestibular for danificado, o paciente pode referir tontura e marcha oscilante. O grau inicial da perda pode ser instável. Por exemplo, depois que a exposição tenha cessado, a perda auditiva pode recuperar-se para os limiares normais e em outros casos pode progredir para um grau mais severo. Devemos pesquisar o início, sintomas no momento, história médica e cirúrgica, medicações, exposição anterior a ototóxicos, etc. É importante relembrar que em pacientes acamados a ataxia típica e a osciloscopia não ocorrem, diferentemente dos pacientes ambulatoriais. O quadro clínico é o de uma labiríntopatia periférica e o paciente pode apresentar sintomas e sinais relacionados com lesão coclear, como hipoacusia, zumbidos de alta freqüência e plenitude auditiva ou sintomas e sinais relacionados com a função vestibular, especialmente vertigens, desequilíbrios, nistagmo e manifestações neurovegetativas. A alteração auditiva, bem como a disfunção vestibular, pode ser unilateral ou bilateral (Oliveira,1990).
4.2- AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA DA FUNÇÃO COCLEAR E VESTIBULAR
Deve ser feita para se conhecer o local, o grau de ototoxicídade e a possibilidade de uma reabilitação do paciente, bem como para realização de diagnóstico diferencial com outras labirintopatias periféricas. Vários autores recomendam realização dos testes de Weber, Rinne, Schwabach, pesquisa de movimentos oculares anormais (nístagmos), exames de pares cranianos teste de Romberg, além de verificação de funções cerebelares para pesquisa de disfunções cerebelares e neuropatias periféricas.
Segundo Fee, o teste calórico de Hallpike é suficiente para detectar a ototoxídade, porém Jongkees e Hulk acreditam que há superioridade do estímulo rotacional do reflexo vestíbulo ocular sobre os testes calóricos para detectar ototoxidade por Streptomicina.
Outros testes audiométricos a serem realizados consistem numa audiometria de tons puros por via aérea e óssea, logoaudiometria e impedanciometria (Barber, 1979). Na audiometria de tons puros, o paciente apresentara hipoacusia neurossenrorial com maior perda auditiva uni ou bilateral nas freqüências agudas. Essa hipoacusia poderá ser irreversível e de graus variados, como no caso de aminoglicosídeos, ou reversível, como, por exemplo, no caso dos salicilatos , aspirina ou diuréticos, como ácido etacrínico, furosemida e outros. Com a logoaudiometria, avalia-se a capacidade de discriminação do paciente, possibilitando estudar a validade de indicação de um aparelho de amplificação sonora. Com a impedanciometria, deve-se detectar a presença do reflexo estapediano, dando a possibilidade de confirmar a presença de recrutamento de Metz, pois a lesão é coclear.
Para detecção dos limiares eletrofisiológicos, dois exames atuais têm sido muitas vezes utilizados para avaliação da audição, especialmente em crianças de pouca. idade, e pacientes com diminuição da consciência, a eletrococleografia e a audiometria do tronco cerebral (Jewett,1971 ). Com eles, pode se avaliar o grau de perda auditiva. Na eletrococleografia é analisada a onda I (potencial de ação composto do nervo acústico) e no BERA (respostas auditivas evocadas do tronco cerebral) a onda V é a mais utilizada - potenciais gerados ao nível do colículo inferior (Marseillan,1979 e 1977). Tanto a eletrococleografia como a audiometria de respostas auditivas evocadas do tronco cerebral são métodos objetivos, por isso importantes na avaliação das crianças de pouca idade (Bernard,1980). Estudos realizados com ECOG. mostram imediata redução no potencial de ação e no microfonismo coclear com minutos da infusão EV de aminoglicosídeo, porém devemos lembrar os riscos da realização do ECOG. em pacientes debilitados. Se houver dano ototóxico incompleto e há parada da exposição, existe a chance de reversibilidade de 10 a 15%.
5. MONlTORlZAÇÃO
A monitorização é importante de ser realizada durante a administração da droga para determinar a progressão da ototoxicidade. À medida que o número de agentes ototóxicos e o conhecimento de fatores sinérgicos para ototoxicidade vem a aumentando, vários fatores de risco devem ser considerados:
1. Alteração da função renal.
2. Altos picos séricos da droga.
3. Tratamento prolongado (principalmente mais de 14 dias) com altas doses.
4. Idade (idosos com mais de 65 anos e neonatos).
5. Combinação da droga com o ruído.
6. Hipoacusia e zumbido prévios.
7. Combinação de drogas especialmente com diuréticos.
8. Mau estado geral.
9. Presença de otites médias.
10. Tendência familiar.
O número de métodos audiológicos para monitoramento da ototoxicidade vem crescendo, mas estes testes devem ser selecionados para melhor avaliação a menor custo ao paciente. Os teste consistem em:
1. Audiometria convencional: inclui a audiometria de tons puros por via aérea e óssea com freqüências de 250-5000 Hz, impedanciometria e discriminação vocal. O ponto mais controverso é o critério para considerarmos uma alteração significativa. Tradicionalmente considera-se alterações nos limites, maiores de 15 dB em uma ou mais freqüências ou 20 dB em uma. Outros autores consideram uma perda auditiva de 25 dB nas freqüências de 500 1000 e 2000 Hz. A monitorização deve ser feita pelo menos uma vez antes do tratamento e uma a duas vezes por semana durante o tratamento observando-se principalmente nas altas freqüências. Estes testes devem ser feitos até 3 meses após o tratamento.
2. Audiometria de alta freqüência: pode determinar perdas maiores de 8000 Hz permitindo diagnóstico precoce antes das perdas atingirem a faixa de audição social.
3. Emissões otoacústicas: são sinais gerados espontaneamente pelo ouvido em resposta à estimulação acústica gerada na cóclea, portanto apresentam vantagem de ser um método bastante sensível para detectar precocemente a ototoxicidade, já que a maioria das ototoxinas afetam inicialmente as células ciliadas externas.
4. Registros eletronistagmograficos: realiza a monitorização vestibular. O mais utilizado é o teste calórico. Deve ser feito um primeiro teste antes ou até 72 horas depois de iniciado o tratamento. Em seguida devem ser feitos testes semanais. Uma redução de 50 % ou mais do sistema vestibular em pelo menos um dos ouvidos significa, vestibulotoxicidade e para casos de ototoxidade por estreptomicina, podem ser realizadas provas rotacionais.
5. "Check-lists": método mais formal e prolongado de questionário para detectar o primeiro sinal de perda auditiva, prevenindo que passe despercebido. É um método de baixo custo e útil principalmente em pacientes de baixo risco para ototoxicidade
6. OTOXICIDADE E MONITORIZAÇÃO PEDIÁTRICA
Entre as crianças, são os recém-nascidos com infecções graves no berçário de terapia intensiva que recebem antibióticos aminoglicosídeos. Isso porque essas drogas, apesar de seus efeitos colaterais ototóxicos, são altamente eficazes contra infecções graves causadas por microorganismos Gram-negativos, como Enterobacter, Haemophilus, Klebsiella Escherichia coli Pseudomonas, Proteus, Bacterióides. Esses microorganismos podem provocar nessas crianças infecções graves nos tratos respiratório e urinário. Infecções de pele e tecidos moles, especialmente em queimados, septicemias, infeções polimicrobianas, infeções pós-cirúrgica e pós-traumática, peritonites, infecções em crianças com problemas oncológicos e com granulocitopenias. Nesses casos, os antibióticos mais utilizados têm sido gentamicina, amicacina, tobramicina, netilmicina, eficazes contra esses tipos de infecções (Oliveira,1989 e 1990). A ototoxicidade na infância é um tema bastante controvertido. Vários autores têm publicado porcentagens variáveis de casos de ototoxicoses em crianças, decorrentes do uso de vários antibióticos aminoglicosídeos. Outros autores relatam ausência de ototoxicose em crianças que receberam essas drogas. Como vários estudos tem sido retrospectivos e poucos prospectivos, com doses e seguimentos adequados, é difícil ter uma idéia precisa da ototoxicidade infantil (Oliveira,1990). Muitos estudos deverão ser feitos, especialmente com BERA, que permite monitorização adequada da função auditiva (Bemard,1980). Ainda com relação a ototoxicidade na criança, alguns pontos devem ser ressaltados para maior segurança na aplicação dessas drogas:
a) predisposição familiar - as drogas devem ser evitadas quando há história familiar;
b) ototoxícidade fetal - essas drogas podem atravessar a placenta quando administradas as gestantes;
c) função renal - neste caso a taxa de filtração glomerular é baixa e a droga pode se acumular no soro e perilínfa;
d) prematuridade;
e) o papel do ruído da incubadora na potenciação do efeito da droga (Oliveira,1989; Proctor,1981; Winkel,1978).
Os fatores de risco nas crianças podem ser referidos como sendo apnéia, hipóxia, hiperbilirrubinemia, desequilíbrio eletrolítico, hipotensão, meningites, septicemia, manutenção em incubadora, terapia diurética, insuficiência renal (Faden,1982), hipoacusia e zumbidos prévios, tratamento prolongado e com altas doses, combinações de droga ototóxica e exposição ao ruído, mau estado geral, desnutrição, otites médias. Em qualquer dessas situações, deve-se evitar ou utilizar com muito cuidado esses antibióticos (Oliveira,1990).
7. PREVENÇÃO DA OTOTOXICIDADE
Quando ocorre uma lesão vestibular por uma das drogas citadas, pode ocorrer o mecanismo de compensação central e com o tempo os sintomas e sinais desaparecem auxiliados, é claro, por tratamento antivertiginoso e cinesioterapia. Quando ocorre lesão coclear, há destruição das células ciliadas do órgão de Corti e a perda auditiva é irreversível, não havendo tratamento. Nesses casos, dependendo do grau da hipoacusia, o paciente deverá ser submetido reabilitação auditiva e da linguagem. Devemos lembrar que em crianças uma perda auditiva irreversível iatrogênica desse tipo pode dificultar-Ihes a comunicação para o resto da vida. Daí a importância de evitar o uso dessas drogas, a não ser em casos onde haja risco de vida. Como não há tratamento para recuperar a audição, temos que conhecer algumas regras básicas da ototoxicidade (Oliveira,1990).
7.1- Recomendações Pará a prevenção das ototoxicoses
1. Evitar o uso de drogas ototóxicas, principalmente os antibióticos aminoglicosídeos, administrando essas drogas, sempre com orientação pelo antibiograma, apenas quando não há outra possibilidade, ocorrendo risco de vida devido a infeção grave, especialmente por microorganismos Gram-negativos.
2. Conhecer os fatores de risco do paciente, especialmente a função renal. Evitar a aplicação dessas drogas nesses casos (Oliveira,1990).
3. Quando há necessidade de tratamento com essa drogas, ministrar doses seguras; por um tempo não prolongado e escolher as drogas eficazes e menos tóxicas. Entre a amicacina, gentamicina, tobramicina e a netilmicina, a tobramicina e netilmicina são as menos tóxicas, especialmente a netilmicina (Herting,1980)
4. Durante o tratamento, principalmente em pacientes com fatores de risco, devesse realizar a monitorização auditiva e vestibular; no caso de criança, se possível com a audiometria de tronco cerebral (Bernard, 1980). Caso não seja possível a monitorização, pelo menos um seguimento minucioso do paciente, para detecção de sintomas auditivos e vestibulares, deve ser realizado.
8. O TRATAMENTO DA OTOTOXIDADE:
Pacientes com perda auditiva profunda deve-se fazer uso de prótese e se necessário, implante coclear. O tinitus deve ,ser controlado (white noise machine ou rádio para dormir ou tinitus masker). A náusea na fase aguda pode ser controlada com anti-heméticos por exemplo. Segundo Black, sedativos e tranqüilizantes como alprazolam e diazepam devem ser evitadas. 0 benzodiazepínico pode ter efeito adverso nos movimentos oculares.
9. USO TERAPÊUTICO NA DOENÇA DE MÉNIÈRE:
Devido a característica tóxica da streptomicína, pode-se fazer ablação seletiva por labirintectomia química em pacientes que falham no tratamento com métodos mais conservadores. Se pacientes apresentarem sintomas bilaterais e intratáveis, deve-se fazer uso intramuscular em doses divididas, continuando tratamento até que:
-dose cumulativa segura pré-determinada seja atingida
-efeitos ototóxicos estejam evidentes.
Devemos lembrar que o efeito vestibular é dado quando a função vestibular e destruída, levando a sintoma como ataxia, perda de equilíbrio e aumento da osciloscopia. Outra via pode ser a transtimpânica, que deve ser descontinuada se:
-sinais de ototoxidade evidentes
-dose limite é atingida
-monitorização indica ototoxidade
Existe também aplicação via canal semi-circular lateral, na tentativa de obter labirintectomia.
10. PESQUISA COM ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO
Tem sido realizados estudos em animais para avaliação das funções auditiva e vestibular durante a administração de drogas supostamente ototóxicas. A avaliação fisiológica da audição tem sido feita com métodos comportamentais, como o reflexo de Preyer, o condicionamento por reforço negativo e o condicionamento operante, e com métodos eletrofisiológicos, como o registro das respostas elétricas cocleares e do tronco cerebral por estimulação acústica com a técnica de eletrodos implantados. A avaliação da função vestibular em animais tem sido feita com a prova térmica bilateral e a prova rotatória pendular. A avaliação fisiológica tem sido complementada por estudos histológicos dos epitélios ciliados do órgão de Corti e das máculas e cristas do sistema vestibular. Tem sido utilizadas: a técnica das secções seriadas, a técnica de preparações de superfície, a técnica de microscopia eletrônica de transmissão e de varredura. Todas contribuem para analisar as lesões histológicas provocadas pelas drogas ototóxicas (Oliveira,1989 e 1990). Tem sido observada perda maior das células ciliadas externas, sendo as células ciliadas internas mais resistentes. As perdas são maiores nas espiras basais e as duas primeiras fileiras de células ciliadas externas são mais intensamente destruídas. As lesões dependem da dose da droga e da evolução do tratamento. Técnicas recentes de cultura de células ciliadas de órgão de Corti de camundongos têm permitido estudos com microscopia óptica e eletrônica para avaliação de antibióticos aminoglicosídeos. Esses estudos demonstram que as células ciliadas na espira apical da cultura são menos sensíveis do que as das espirais basais. As células ciliadas externas parecem ser mais extensamente alteradas do que as internas. Esses efeitos ototóxicos são mais severos quando a droga é aplicada na cultura sem cálcio e magnésio na solução, podendo haver bloqueio desses efeitos, elevando a concentração salina de cálcio e magnésio (Richardson, 1991 ). Esses estudos em meio de cultura, de células ciliadas, poderão ser no futuro um modelo potencial para a pesquisa da ototoxicidade dos aminoglicosídeos in vitro. Outro método aplicado recentemente para o estudo da ototoxicidade aguda de drogas in vitro utiliza células ciliadas do órgão de Corti de cobaia isoladas e mantidas em meio de cultura. Foram estudados os efeitos da gentamicina, por exemplo, na viabilidade celular e nas respostas móveis das células. A despeito da inibição da entrada do cálcio pelo aminoglicosídeo, a habilidade das células ciliadas externas apresentarem respostas móveis com despolarização pelo potássio não alterou. Não há também modificação da viabilidade das células ciliadas externas, nem alteração da contractilidade das células ao estímulo elétrico (Dulon,1989).
Uma droga que tem sido estudada com estes métodos modernos de cultivo de células ciliadas externas isoladas é o salicilato de sódio, a aspirina (Shebata, 1991). A grande importância dessa droga é o fato de provocar alterações auditivas reversíveis, perdas auditivas temporárias bilaterais, simétricas , horizontais ou descendentes (maior nas altas freqüências). É conhecido que o salicilato afeta as células ciliadas externas ou o suprimento sangüíneo da cóclea. Pesquisas recentes tem mostrado que o salicilato afeta a liberação de neurotransmissores na junção das células ciliadas internas e do nervo auditivo , afetando bastante essas células. Esse fato é importante para a compreensão futura da ototoxicidade dos salicilatos. Outro achado é a demonstração de que o salicilato reduz in vitro a motilidade das células ciliadas externas artificialmente induzida pela estimulação elétrica. Isso se deve a alterações observadas nas cisternas laminares supostamente necessárias para a contração dessas células.
11. IMPORTÂNCIA DAS PESQUISAS EM OTOTOXICIDADE
As pesquisas neste campo da ototoxicidade têm contribuído para eliminação de várias drogas ototóxicas do arsenal terapêutico, evitando assim surdez iatrogênica. Tem permitido selecionar drogas menos ototóxicas e eficazes para o tratamento de infecções graves causadas por microorganismos Gram-negativos. Tem contribuído para maior eficácia na monitorização auditiva e vestibular. Tem possibilitado a administração de tratamento controlado e mais seguro com doses adequadas e menos risco de surdez. Grandes contribuições nas áreas básicas de anatomia, histologia, eletrofisiologia, bioquímica e farmacologia do ouvido interno foram feitas pelas pesquisas em ototoxicidade (Oliveira,1990).
Convém chamar a atenção para alguns estudos de ototoxicidade que devem ser estimulados, tais como os possíveis efeitos da aplicação de ototóxicos locais no ouvido médio, cujos relatos tem sido controvertidos. Também seria importante estabelecer a possibilidade de seu uso seguro no ser humano. Da mesma forma devem prosseguir os estudos de proteção do órgão de Corti contra drogas ototóxicas os de uso de drogas menos ototóxicas, os de labirintectomia química com essas drogas ototóxicas, os de degeneração e regeneração das células ciliadas e fibras nervosas após as alterações pelos ototóxicos, os dos efeitos dos ototóxicos in vitro aplicados em cultura de células ciliadas do órgão de Corti, os dos efeitos da privação sensorial após lesão do órgão de Corti por ototóxicos e sua importância na indicação dos implantes cocleares , os de outros tipos de epitélio ciliado para a utilização de um modelo experimental que possibilite avaliar a ação dos ototóxicos in vitro (Oliveira,1989 e 1990).
12. AMINOGLICOSÍDEOS
12.1- História e origem.
A ineficácia da penicilina G no tratamento de processos infecciosos provocados por microorganismos Gram-negativos foi o primeiro estímulo para a procura de agentes antimicrobianos eficientes contra estas bactérias. O desenvolvimento da estreptomicina foi produto de uma pesquisa científica bem planejada de. substâncias antibacterianas. Waksman e colaboradores examinaram uma série de actinomicetos presentes no solo, no período de 1939 a 1943, e demonstraram a elaboração por estes fungos de numerosos antibióticos; contudo, nenhum destes antibióticos era útil do ponto de vista clínico, por serem muito tóxicos ou sem atividade suficiente. Em 1943, uma variedade de Streptomyces griseus foi isolada e elaborava uma potente substância antimicrobiana. O primeiro relato público da descoberta deste novo antibiótico - estreptomicina - Foi feito por Schatz. Bugie e Waksman no princípio de 1944, e se constatou ser capaz de inibir o crescimento dos bacilos da tuberculose e numerosos microorganismos Gram-positivos e Gram-negativos in vitro e in vivo, hoje em dia, está praticamente restrito ao tratamento da tuberculose. Houve relatos de surdez irreversível e distúrbios do equilíbrio. As primeiras queixas eram distúrbios visuais durante movimentos, deixando dúvidas se o fenômeno era central ou periférico. Em 1948, Causse demonstrou a ação da Streptomicina agindo diretamente nas estruturas labirínticas. O desenvolvimento da Dehidroestreptomicina teve a finalidade de diminuir a toxidade vestibular, porém demonstrou-se alta toxicidade coclear, sendo seu uso clínico abandonado. A Neomicina foi isolada por Waksman e Lechevalier a partir do Streptomyces fradies, sendo seu uso restrito à via tópica pois apresenta grande oto e nefrotoxidade à via parenteral. Umezawa e cols. desenvolveram a kanamicina, bastante efetiva contra bactérias entéricas (menos Pseudomonas). Em 1960 foi isolada a Gentamicina, que é o mais utilizado dos Aminoglicosídeos, e tal como a Netilmicina é produzido por espécies de Actinomyces micronospora. Outros Aminoglicosídeos como a tobramicina(1967), Amicacina(1972, primeiro aminoglicosídeo semi-sintético), e Netilmicina, foram desenvolvidos para. suplantar a resistência da Pseudomonas. A ação dos aminoglicosídeo é primariamente contra bactérias G-, e o desenvolvimento de resistência é resultado da aquisição de plasmídios que contém genes que codificam enzimas que os metabolizam. Seu uso em ORL se torna importante se lembrarmos que a Pseudomonas aeruginosa é agente da otite externa maligna, além de estar associada à afeções do ouvido médio e colesteatoma. Além disto, a E. coli, K.pneumonie, P.mirabilis e espécies de enterobactérias também são freqüentemente encontradas nas afeções de O.M. Devemos lembrar que iodo aminoglicosídeo é ototóxico alguns primeiramente cocleotóxico outros primeiramente vestibulotóxico, sendo o que os difere em sua toxidade é o número de aminas ou netilaminas livres ligados à porção glicosídea da molécula.
12.2- Administração é eliminação:
Sua administração pode ser:
-Parenteral (IM ou EV): principalmente para injeções profundas, pois somente 3% da droga é absorvida por via oral.
-Tópico.
-Intratimpânica: usado no tratamento da doença de Ménière.
-Intratecal: aumenta a probabilidade de haver ototoxicidade.
Há também casos de absorção em irrigação de articulações. A penetração na BHE é encontrada só em neonatos. Também há possibilidade de ocorrer ototoxicidade na esterilização intestinal com neomicina em pacientes com colite ulcerativa, no uso de aminoglicosídeo em diálise peritoneal e na absorção pela mucosa desnuda com aplicação de antibióticos em queimaduras de terceiro grau. Os aminoglicosídeo são metabolizados e excretados quase exclusivamente por filtração glomerular, sendo sua concentração urinária cerca de 10 vezes maior que a sangüínea, e atecidual 1/3 desta. Portanto, se houver diminuição da função renal, deve se ajustar as doses ( ¯ excreção e consequentemente concentração sangüínea ), aumentando as chances de oto e nefrotoxidade.
12.3- Toxicologia dos Aminoglicosídeos:
É difícil avaliar qual aminoglicosídeo tem o menor índice de ototoxidade ( vestibular ou coclear) e/ou nefrotoxicidade. Evans, em sua revisão de 45 trabalhos sobre os vários tipos de aminoglicosídeo ( amica, genta, netit, siso e tobra ) não chegou a conclusão sobre qual o mais ototóxico ou nefrotóxico. Kahlmeter e Dahlager, em revisão de estudos de 1975 a 1982 acreditam que a netilmicina tem ototoxidade ligeiramente menor. Nestes estudos a perda é geralmente em altas freqüências, sendo alguns casos unilaterais e ocasionalmente reversíveis.
Por outro lado, alguns estudos feitos em animais de laboratório mostram diferenças quantitativas da toxidade dos aminoglicosídeos, demonstrando que:
-genta e sisomicina são as mais ototóxicas
-tobramicina em posição intermediária
-netilmicina é a menos tóxica,
A amicacina estaria em posição intermediária semelhante a tobramicina, porém sua dose terapêutica é 3 a 5 vezes maior que a mesma, levando a uma ototoxidade semelhante a gentamicina .
Pelos estudos de Benduch em 1982, em relação a cocleo/vestibulotoxidade temos:
ATB VESTIB COCLEAR
streptomicina +++ + tobramicina + + gentamicina ++ + netilmicina + + kanamicina + +++ amicacina + +++ neomicina + ++++
A base bioquímica e molecular dos aminoglicosídeo foi elucidada por Willians, Zenner e Schacht, que evidenciam o mecanismo de várias partes da ototoxidade. Inicialmente, há passagem do aminoglicosídeo através dos vasos, o que é reversível e antagonizado por cátions bivalentes de cálcio e magnésio. Hermes sugere a ação do cálcio como inibido competitiva da Genta, sugerindo o uso via oral para minimizar a ototoxidade. O próximo passo é a entrada na célula, que depende de energia, interferindo em vários processos intracelulares. Devemos lembrar que os aminoglicosídeo têm efeito pior com a função renal alterada. O dano agudo se manifesta geralmente com tinítus, porém este sintoma pode estar ausente. A queda da audição se dá primeiramente nas altas freqüências, progredindo depois para freqüências baixas. O ouvido humano pode ouvir além de 16000 hz, mas os exames só detectam abaixo de 8000hz. 0 paciente vem com queixa quando a perda já é em torno de 30 dB, e que inclui freqüências mais baixas (3000- 4000 hz). Portanto, a detecção precoce é difícil. Os pacientes debilitados podem não relatar inicialmente o zumbido, queixando-se apenas após a suspensão do medicamento.
Os efeitos ototóxicos presentes após duas ou três semanas do término ou da mudança da terapia são praticamente definitivos. 0 modelo de toxidade coclear é feito em animais. O mais notável é a perda de células ciliadas, que ocorre primeiramente na espira basal, progredindo para o ápice. Atinge primeiro a 1 fila, depois a intermediária e, após, a mais externa. Podemos confirmar este fato pelo tinitus, que é o primeiro sintoma, de tons altos e contínuo que sugere lesão na base da cóclea. Apenas após as células ciliadas externas serem lesadas é que teremos alterações nas células ciliadas internas, seguidas das células de suporte do Órgão de Corti. O dano nas células ciliadas internas é mais severo no ápice e progride para a base. Não há recuperação da função quando as células são lesadas. A manifestação mais comum da vestibulotoxidade é o desequilíbrio, demonstrado pelo andar atáxico, tropeços freqüentes e perda do equilíbrio a movimentos bruscos. Geralmente os pacientes necessitam de apoio e ajuda da mão ao andar, podendo ter vertigem posicional passageira. Com o uso de alguns ototóxicos os pacientes podem apresentar osciloscopia, que a sensação que objetos visíveis "pulam" quando do movimento da cabeça, ao se movimentar ou ao andar de carro. Este sintoma é resultado da perda do reflexo vestibulo-ocular.
A Streptomicina e a Genta agem primeiramente na porção vestibular. No caso da Streptomicina a seletividade pode ser usada no tratamento da doença de Ménière. Em alguns casos a ototoxidade vestibular é reversível sendo que o dano Permanente geralmente ocorre 2 a 3 meses após administração da droga. A compensação através do Sistema Visual proprioceptivo é feito por tempo extenso. O dano histológico é semelhante ao da cóclea. Há perda das células ciliadas que não são regeneradas, perda das células ciliares na mácula utricular e sacular tal como na crista dos 3 canais semicirculares . Acredita-se que as células ciliadas tipo I sejam mais sensitivas a danos do que as células ciliadas tipo II. Os aminoglicosídeo também causam lesões na membrana otoconial e estruturas otolíticas, comprovado por estudos em porquinhos da Índia, com uso de Strepto, no qual há diminuição do número de otolitos na membrana otolítica, no utrículo e no sáculo. Devemos relembrar que estudos em animais são realizados na tentativa de mimetizar os efeitos do ototóxico que ocorrem em seres humanos, pois os animais empregados nestas experiências são saudáveis e as doses aplicadas são diferentes. Acredita-se que se houver uma diminuição do clearance renal, há um aumento da meia-vida dos aminoglicosídeo na perilínfa. Estudos em animais demonstram que o aminoglicosídeo é "clareado" mais lentamente na perilinfa e na endolinfa do que dos níveis sangüíneos. Também em animais é descrito a ototoxidade dos aminoglicosídeo potencializados com uso de diuréticos de alça. Acredita-se que no uso de diuréticos de alça, primeiramente e após o uso de aminoglicosídeo, a toxidade do aminoglicosídeo manteria-se a mesma, porém, o uso de aminoglicosídeo e posterior uso de diurético levaria a um efeito sinérgico, pelo fato do aminoglicosideo interagir com a membrana celular do ouvido interno, que facilitaria a entrada do diurético gerando maior ototoxidade. Ha também sinergismo dos aminoglicosídeo com ATB b-Iactamicos (porem sem alteração da ototoxidade). Várias Serratias são inibidas pela combinação de netilmicina com carbenicilina, cefalomandone, azlocilina, mez/ocilina, cefotaxime e moxaiactam. Além da ototoxidade, os aminoglicosídeo podem apresentar nefrotoxidade, que se manifesta inicialmente por uma proteinúria passageira, podendo levar, em alguns casos, até a azotenúria. Outras toxidades também são descritos para os aminoglicosídeo. Eles podem causar bloqueio neuromuscular e apnéia após infusão EV rápida, lavagem peritoneal ou pleural ou em pacientes em uso de aminoglicosldeo que são submetidos a anestesia geral. Estes efeitos são geralmente revertidos com o uso de anticolinesterase. Alguns agentes ototóxicos podem atravessar a placenta (como o aminoglicosídio ), levando à danos vestibular e coclear, além de outras mal formações congênitas (fissuras palatinas, malformações esqueléticas, defeitos oculares, anormalidades no sistemas cardiovascular, genitourinário e gastrointestinal )
12.4- Uso em crianças
Estudo em crianças (genta, kana e streptomicina}, realizado em 1300 recém-nascidos não constatou diferença entre nefro e ototoxidade. As doses devem ser sempre apropriadas, sendo baseadas na superfície corpórea e não no peso, não devendo ser também associada com diurético de alça, indometacina e vancomicina. Se for necessário administrar altas doses (fibrose cística, p/ex.); monitora- se a concentração sangüínea.
13. VANCOMICINA .
Os primeiros casos de ototoxicidade foram descritos em 1958 por Geraci cols. É um antibiótico usado clinicamente no tratamento de infeções por S. aureus meticilino resistente e usado oralmente como tratamento de colite pseudomembranosa. A ototoxicidade ocorre quando medicado por via parenteral, já que seu uso via oral não leva a sua absorção significativa. Recentemente vem sendo estudado através da cromatografia e radioimunoensaio a farmacocinética para determinar a curva da concentração dos seus níveis séricos e assim, realizar um monitoramento como prevenção da ototoxicidade, principalmente em pacientes do grupo de risco (idosos e prematuros). Foram documentados perda auditiva em humanos a níveis superiores a 30-40 mg/l com presença de zumbidos relacionados com o pico sérico da droga a 40-50 mg/l; o nível sérico terapêutico usual é de 6-10 mg/l. O seu uso no segundo ou terceiro trimestre da gestação a aparentemente não leva a perda neurossensorial ou nefrotoxicidade no feto. O aumento da incidência de ototoxicidade vem sendo observado em animais de experimentação e em humanos que receberam uma combinação da vancomicina com a aminoglicosídio, principalmente naqueles com quadro de perda auditiva permanente. A ação ototóxica da vancomicina em si, parece ser pequena. Análogos da vancomicina como o Teicoplanin e Daptomycina podem ser considerados similares á vancomicina em relação a ototoxicidade.
14. ERITROMICINA
Os primeiros casos foram relatados em 1973 por Mintz e cols. e até o momento pelo menos 32 casos foram documentados de ototoxicidade (perda auditiva, zumbido e ocasionalmente vertigem) em associação ao seu uso endovenoso ou oral em altas doses. A maioria destes pacientes eram idosos com insuficiência renal ou hepática ou pacientes que fizeram tratamento por pneumonia causada pela Legionella pneumophilia.
A perda auditiva pode ocorrer inicialmente nas freqüências da fala, simultaneamente às altas freqüências, levando o indivíduo a perceber esta perda precocemente, diferentemente da perda auditiva resultante do uso de aminoglicosídios que se inicia nas altas freqüências. Ela é geralmente bilateral e reversível na maioria dos casos após 3 dias da suspensão do medicamento. Existem, entretanto, casos de perda auditiva irreversíveis. Não se sabe ao certo o mecanismo da sua ototoxicidade. Existem casos de pacientes com acometimento a nível do Sistema Nervoso Central manifestada sob a forma de diplopia, confusão, paranóia e alucinação associado a perda auditiva. Em animais de experimentação submetidos a injeção de eritromicina, verificou-se alteração ao nível do BERA da onda IV seguida pela onda III e II, mas sem alterações no microfonismo coclear ou potencial de ação; sugerindo desta forma a ação da eritromicina a nível das vias auditivas centrais.
A ação da eritromicina é claramente dose dependente e portanto, altas dosagens e pequena capacidade para eliminá-la apresentam uma maior probabilidade ototóxica. Segundo Schweitzer e cols., a prevenção da ototoxícidade induzida pela eritromicina deve obedecer a alguns parâmetros:
1.A dose diária não deve exceder 1,5 g se concentração de creatinina for maior que 180 mols/l.
2. Pacientes idosos e com insuficiência renal ou hepática devem realizar audiometria pré e pós tratamento.
3. tomar precaução ao fornecer eritromicina em pacientes que já estão recebendo drogas ototóxicas como furosemide, cisplatina ou aminoglicosídio.
A claritromicina e azitromicina são dois novos antibióticos macrolídios. Até o momento, não foram documentados casos indicando sua ototoxicidade. Hopkins em 1981 mostrou anormalidades do SNC e SNP em 1,3% dos pacientes que fizeram uso de azitromicina. Ainda é muito cedo para se ter alguma conclusão a respeito destes dois novos antibióticos. Eles apresentam grande vantagem de serem utilizadas em baixas doses e por poucos dias o que pode levar a um aumento progressivo dos seu uso em doses maiores em outras formas de apresentação com aumento de penetração tecidual elevando o risco de ototoxidade.
15. CISPLATINA
É um metal pesado usado como droga antineoplásica para tratamento de tumores. Seu estudo farmacocinético mostra uma importante quebrada cisplatina em proteínas séricas tóxicas. Não se sabe ao certo onde elas são formadas (ouvido interno ou outra parte do corpo como fígado ou rins), mas o fígado converte estes metabólitos tóxicos em não tóxicos rapidamente.
Existem várias hipóteses para tentar explicar o mecanismo da sua ototoxicidade, mas todas inconclusivas. Estudos recentes em animais de experimentação mostraram a ação ototóxica similar da cisplatina com os aminoglicosídeos, com acometimento das células ciliadas externas da espira basal da cóclea inicialmente e da espira apical posteriormente. Sua ação está relacionada à redução da sua motilidade, bloqueamento dos canais de transdução e eventualmente destruição das células. Experimentalmente, observou-se lesão da estria vascular apenas com injeção em altas doses endovenosas de cisplatina levando a redução do potencial endococlear, o que. não foi observado com múltiplas injeções em baixas doses.
Os sintomas mais comuns sugestivos de ototoxicidade são:
1. Otalgia.
2. Zumbido: ocorre em 2% a 36% dos pacientes. Geralmente é transitório ,
desaparecendo após algumas horas ou semanas do fim do tratamento.
3. Sintomas vestibulares: pode ocorrer ocasionalmente em pacientes com função vestíbular anormal pré existente.
4. Perda audítiva ocorre em 9% a 91% dos pacientes. Geralmente é bilateral e
inicialmente nas altas freqüências (6000-8000 Hz), que podem estender a freqüências menores com o tratamento prolongado. O paciente pode apresentar certo grau de reversibilidade, mas se a perda for profunda; geralmente é permanente. A perda pode ser progressiva e cumulativa ou pode ser súbita.
Os fatores de risco são dependentes de:
1. Idade.
2. Sucetibilídade individual.
3. Função renal.
4. Intervenção com outras drogas ototóxicas.
5. Local do tumor: priricipalmente em tumores no crânio.
6. Modo de administração da droga: ototoxicidade é maior após injeções em
bolo, e portanto ela deve ser fornecida em baixas doses, divididas em vários meses.
7. Dose acumulativa: estudos prospectivos sobre a ototoxicidade da cisplatina latina mostram que:
- dose de 20 mg/m2. . . . . . . . . . . . . . . . .9% desenvolvem perda auditiva.
- dose de 50 mg/m2. . . . . . . . . . . . . . . . . 46% desenvolvem perda auditiva.
- dose de 100-120 mg/m2. . . . . . . . . . . . 81 % desenvolvem perda auditiva.
O efeito da ototoxicidade é determinado mais pela quantidade fornecida em cada dose do que pela dose cumulativa.
Devido a importância da cisplatina como quimioterápico, é essencial a investigação de métodos para alterar a dose limite de toxicidade, sem causar redução em sua atividade antineoplásica. Outros antineoplásicos ototóxicos são a vincristina a mostarda nitrogenada. 6-amino nicotinamida misonidazole DL-difluorometil ornitina
16. DIURÉTICOS DE ALÇA
São compostos que exercem potente efeito natriurético através da inibição na reabsorção de íons nas células epiteliais da alça de Henle. Os diuréticos mais comumente conhecidos são o ácido etacrinico e furosemide.
O furosemide é excretado pela urina. Sua eliminação diminui de maneira importante em pacientes com insuficiência renal podendo prolongar a meia vida, de eliminação de 30 minutos para 10 a 20 horas, levando a um aumento dos seu nível plasmático e assim a um maior risco de ototoxicidade geralmente associada a níveis maiores que 50 mg/l.
O mecanismo da sua ototoxicidade não é bem conhecido. Parece que age sobre a bomba de íons no ducto coclear assim como nos rins com bloqueio no sistema de transporte de KCI para fora das células marginais na estria vascular. Experimentos em animais mostram que a utilização de ácidos orgânicos como probenecide ou penicilina G previamente a administração de furosemide, apresenta efeito protetor por mecanismo de competição nos tecidos do ouvido interno. Esta proteção com ácidos orgânicos para furosemide não é encontrada para o ácido etacrínico, sugerindo que o mecanismo de ototoxicidade entre elas seja diferente.
A incidência de ototoxicidade a furosemide é de 6,4%. Geralmente a perda auditiva é temporária e totalmente reversível, existindo porém, casos de perda permante. A maioria dos casos não estão bem documentados, já que a maioria dos diuréticos de alça estão associados a uso concomitante de aminoglicosídio. Existem estudos referindo que a ototoxicidade do furosemide possa ser minimizado com uso de infusão continua em baixas doses para evitar um pico sérico, que estaria associado a um maior risco. Tem-se comunicado também ototoxicidade com piretamida, bumetanida e indapamida a nível principalmente coclear.
17. SALICILATOS
Os salicilatos são uma das drogas mais comumente utilizadas na clinica. São absorvidas rapidamente no trato gastrointestinal, atingindo a circulação sistêmica, sendo encontrada após 1 hora nas células ciliadas externas e gânglio espiral, difundindo-se rapidamente para toda parte do ducto coclear, sem evidências de acumulação em estruturas específicas da cóclea.
Vários estudos foram realizados para tentar determinar o mecanismo da ototoxicidade. Estudos mais recentes atribuem a ototoxicidade a alteração bioquímica e fisiológicas como decréscimo do fluxo sangüíneo e permeabilidade anormal da membrana das células ciliadas externas mediadas por catecolaminas (aumento de norepinefrina) ou metabólitos do ácido aracdônico (decréscimo de prostaglandinas). Este fenômeno seria temporário e não levaria a alteração morfológica mais severa a ponto de levar a morte das células sensoriais. Outros estudos propõem a formação de um hidrops baseando-se nas modificações audiometrias com o teste de glicerol. As manifestacões clínicas quando altas doses de salicilatos (salicismo) são utilizadas incluem náuseas, vômitos, confusão, cefaléia, taquicardia, taquipnéia, zumbido e perda auditiva. O zumbido geralmente é tonal e de alta freqüência, podendo ser um dos primeiros sinais de ototoxicidade. A perda auditiva é geralmente discreta a moderada, bilateral, simétrica e reversível (recuperação ocorre 24 a 72 horas após suspensão da droga). Estudos em humanos foram realizados para tentar determinar uma correlação entre seus níveis séricos com seu efeito ototóxico, verificando que podem ocorrer perdas auditivas a concentração plasmáticas menores que 20mg/dl.
O quinino embora esteja sendo substituído por derivados semisintéticos com menor ototoxicidade é estudado junto com os salicilatos devido as suas manifestações similares; é utilizado como antimalárico, sendo encontrado na água tônica, cinzano e martini.
18. PREPARAÇÕES TÓPICAS
Alguns antibióticos aminoglicosideos e outras drogas são usados no tratamento de otites médias crônicas supurativas para eliminar otorréia e permitir a realização das timpanoplastias. Estas preparações aplicadas topicamente, atingem o ouvido médio através da perfuração da membrana timpânica alcançando o nicho da janela redonda e podendo ter acesso ao labirinto membranoso. Sabe-se que a membrana da janela redonda é permeável, existindo transporte por difusão e por meio de vesículas pinocitóticas.(Goycoolea 1980). Em 19T8, Smith e Myers demostraram a passagem de gentamicina e neomicina através da janela oval e argumentaram a questão da ototoxicidade das gotas tópicas. Foi difícil avaliar o papel das gotas tópicas como causa de perda auditiva neuro sensorial assim como foi fácil culpar a otite media crônica como causa desta: Posteriormente, em 1980 Goycoolea e Paparella afirmaram que tanto a doença (pela absorção de toxinas da secreção purulenta) como o tratamento tópico seriam a causa da perda auditiva neuro sensorial encontrada na otite media crônica. A maioria das preparações tópicas contém ingredientes ototóxicos bem documentados em modelos animais, Existem alguns casos na literatura associando perda auditiva com agentes tópicos sem OMC simples. As preparações tópicas contém uma combinação de ácidos , solventes, anti-sépticos, antifúngicos, esteróides, anestésicos e antibióticos (polimixina B, polimixina E, cloranfenicol e neomicina).
O solvente geralmente utilizado é o propilenoglicol. Existem estudos sobre seu efeito em animais de experimentação, todos concordando que as preparações não devem ter altas concentrações do solvente. O anti-séptico usualmente é o álcool. Estudos em animais comprovam que o etanol a 50% colocado diretamente na janela redonda por 10 minutos e etanol a 10% no ouvido médio por 24 horas apresentam efeito tóxico.
O esteróide usado nas preparações inclui a hidrocortizona cujo efeito ototóxico é discutível.
Os anestésicos como procaína, tetracaína e lidocaína podem provocar náuseas e vômitos por ação anestésica dos receptores vestibulares.
Antifúngicos como a nistatina e anfotericina B parecem não ter efeito ototóxico, já o uso de ácido acético 2%, ácido bórico 3% e mertiolate aquoso apresentam ação ototóxica discutível.
As preparações geralmente contém um ou mais antibióticos. Muitos antibióticos comprovadamente atravessam a membrana da janela redonda como cloranfenicol, estreptomicina, gentamicina, polimixina B e neomicina. Estas drogas passam do ouvido médio para o ouvido interno por via linfática, via membranosa da janela redonda ou via sangüínea, podendo desse modo provocar perdas auditivas neurossensoriais. Em relação ao uso de Ciprofloxacin tópico, Esposito e cols. fizeram estudos com seu uso tópico (3 gotas de 250 mg/ml de solução oftálmica 2 vezes ao dia) em pacientes portadores de OMC não encontrando alterações audiometrias ou vestibulares após o tratamento. Anti-sépticos usados há preparação pré operatória como Povidone-iodine tem segundo Aursnes 1982 efeitos ototóxicos; Morizono e Sikora em 1983 demostraram este efeito em modelos animais. Outra substância que resultou ser ototóxica segundo estudos de Bicknell em 1971 é o Chorhexidine.
Apesar de vários experimentos provocando alterações cocleares em animais de experimentação, nota-se poucos casos de ototoxicidade local em humanos. Uma das possíveis explicações seria a maior suscetibilidade desses animais pelo fato da membrana da janela redonda ser delgada e exposta diretamente sem o seu nicho no ouvido médio. Além disso, o seu uso em humanos ocorre geralmente sobre uma membrana espessada com secreção e tecido de granulação no nicho por processo infeccioso, o que tornaria a membrana menos permeável.
Deve se tomar alguns cuidados para impedir a ototoxicidade local:
1. Aplicação com dose segura e por tempo curto.
2. Suspensão do seu uso com a melhora da otite e conseqüente melhora da permeabilidade da membrana.
3. Evitar aplicação de gotas ototóxica na otite média secretora com tubo de ventilação.
4. Evitar aplicação de gotas nas perfura traumáticas.
5. Solicitar audiometria tonal como monitorização em pacientes com fatores
de risco presente.
19. OUTRAS SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS OTOTOXICAS
Chumbo - é encontrado na fabricação de altes, vverniz, tintas, pilhas, baterias elétricas, compostos de chumbo e outros. Trabalhadores expostos a fumos ou poeira de chumbo que demonstraram sintomas de intoxicação, não eram deficientes nos tons baixos de audição (abaixo de 51 Hz), levemente deficitários nos tons 500 a 2000 Hz e grandes deficitários acima de 2kHz Além disso, foram verificados danos de origem coclear que mostram apenas perdas stáma de 2kHz; boa percepção sonora em freqüência médias, mas com deficiência nas faixas de baixa e alta freqüência; patologia retrococlear.
Mercúrio - encontrado em fabricantes de amálgamass dentais, cerâmica , desinfetantes, drogas, fotografia, instrumentos de calibração, em dentistas e outros. Verifica-se dor de cabeça, dificuldades auditivas, restrição do campo visual e descoloração do cristalino. Geralmente os sintomas desaparecem, porém demoram anos, mesmo depois da afastamento da fonte de exposição.
Arsênico - encontrado em descoloração de vidros, pintura as pistolas com pigmentos de composto de arsênico, etc. Quando a absorção é prolongada pode ocasionar perda auditiva neurossensorial severa nas freqüências aItas, indicando problemas do ouvido interno, mudanças patológicas dos olhos, e normalidade a nível eletroencefalográfico, entre outros.
Tri-cloro-etileno - encontrado em limpeza a seco, refrigerração, curtume, esmalte, borracha gráfica, têxtil. Provoca degeneração dos nervos cranianos (trigêmeo, olfatório e facial), vertigem, dor de cabeça, problemas emocionais, perda auditiva NS bilateral, simétrica, em altas freqüências com queda começando em 2kHz ou 3kHz, câncer, distúrbio do labirinto com diminuição da reação de excitabilidade do órgão vestibular nas provas calóricas e rotatórias, achados patológicos periféricos vestibulares centrais.
Dissulfeto de Carbono - encontrado em indústria de fibra de rayon pelo processo de viscose. Provoca deficiência auditiva NS retrococlear, distúrbios vestibulares, respiratórios, renais, irritação.
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FONTE: http://www.surdo.org.br/
* O TEXTO ENCONTRA-SE EM SEU FORMATO ORIGINAL. ERROS GRAMATICAIS E DISTORÇÕES SÃO DE RESPONSABILIDADE DO AUTOR.
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